Ouvidoria Agrária do TJPA cria comitê para gerenciar crise entre empresas e comunidades tradicionais da região de Tomé-Açu


Um comitê foi organizado com o objetivo de apresentar uma solução viável para o impasse envolvendo a empresa Brasil Bio Fuels Reflorestamento, Indústria e Comércio S/A (BBF RIC) e as comunidades tradicionais da região de Tomé-Açu, formada por indígenas, quilombolas e ribeirinhos. Este foi o resultado inicial de um encontro organizado pelo ouvidor agrário do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, desembargador Mairton Marques Carneiro, que aconteceu na manhã de sexta-feira, 1º, no salão do tribunal do Júri do Fórum de Tomé-Açu, a 200 quilômetros de Belém, no nordeste do Pará.

O comitê é formado pela promotora agrária Ione Nakamura, pelo Dr Ibrahim; pelo Dr Pedro Bentes, advogado do escritório Silveira e Athias, que representa a BBF; delegado Almir Alves, diretor adjunto de Polícia do Interior; Andrea Barreto, defensora pública do Estado; Jorde Tembé, advogado da Associação dos Povos Indígenas Tembé e  da Associação Indígena Tembé do Vale do Acará - que reúne a TI Turé Mariquita 1 e 2; Naire Fragoso Rei, diretora da Comissão de Relações Agrárias da OAB; e Maria de Nazaré da Silva Souza, presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Tomé-Açu.

Ficou acertado que os integrantes do comitê devem se reunir já nessa semana que se inicia para receber de cada representante os principais pontos das discussões que envolvem denúncias de invasões de terras da empresa BBF, acusações de furtos de frutos de dendê produzidos pela empresa somando um prejuízo da ordem de R$ 50 milhões; receptação de produtos de furtos por empresas concorrentes; ocupação de terras indígenas sem que esses tenham sido consultados previamente como prevê a constituição; apresentação de documentos de propriedades; salvaguarda dos direitos constitucionais das comunidades tradicionais; danos ambientais, assuntos estes amplamente debatidos entre as partes durante a reunião que se iniciou por volta das 9h20 e que se estendeu até 13h42.

Pelas resoluções tomadas, depois de apresentarem os pontos de discussões, os integrantes do comitê devem elaborar uma solução para o impasse que já causou inúmeros prejuízos para todos os lados com bloqueio de vias, e mortes de pelo menos três pessoas que se encontravam nas áreas sob litígio das partes. Essa solução deve ser apresentada em, no máximo, 30 dias, a contar do dia 1º de abril, segundo determinou o desembargador Mairton Marques Carneiro.

DETERMINAÇÃO

Determinou ainda o desembargador Mairton Carneiro, que as polícias Civil e Militar cumpram seus deveres constitucionais de investigar todos os fatos denunciados pela BBF por meio de seus representantes legais que participaram do encontro, tais como invasão de terras e furto de frutos de dendê, assim como da receptação dos produtos desses furtos por empresas concorrentes. Ele também determinou a apuração de denúncias das comunidades tradicionais de que teria a empresa cometido exageros no tangente a guarda irregular em terras indígenas, bem como, de possíveis danos ambientais que prejudicam povos indígenas, ribeirinhos e quilombolas que dependem da pesca e do extrativismo para sobreviver.

Durante o encontro, o magistrado deu voz a todos os presentes, fazendo críticas aos povos tradicionais que foram convocados e não compareceram, apesar de terem enviado seus representantes jurídicos legais. Eles não compareceram em função das fortes chuvas que caíram de quinta para sexta-feira, causando alagamentos, intrafegabilidade dos ramais e que também esconderam as pontes de madeira existentes ao longo desses percursos.

DISCUSSÕES

Ao abrir a reunião, o desembargador Mairton Marques Carneiro explicou que se deslocou de Belém até Tomé-Açu por se importar com as vidas das pessoas, com o meio ambiente e com a atividade econômica da região de Tomé-Açu, já que a empresa envolvida gera mais de seis mil empregos diretos e renda para toda a área. Disse que, assim, preferia ouvir as partes envolvidas antes de tomar uma decisão e que esperava encontrar o auditório lotado para não falar nada por trás de quem ali não se encontrava para se defender.

A posição da BBF antes do início da reunião foi de que "a empresa reforça que acredita no diálogo transparente com todas as partes interessadas nos seus negócios e pretende expor a situação de suas áreas de plantio. Naquela região, até o momento, a empresa já teve cerca de 6 mil hectares de plantio de palma invadidos por terceiros. Além da insegurança relacionada à posse de sua propriedade, é estimado um prejuízo de R$50 milhões, calculado até o momento, em perdas de frutos e equipamentos pertencentes à empresa, tais como tratores, caminhões, contêineres e óleos. Dessa forma, pretende obter o apoio das autoridades para que as liminares em ações judiciais sejam cumpridas de forma pacífica. A empresa ressalta que se coloca à disposição das instituições públicas e da sociedade civil para eliminar dúvidas e sanar dificuldades sobre a solução deste caso, com o objetivo de continuar a sua atuação responsável e a geração de quatro mil empregos diretos no Pará, a partir da promoção do desenvolvimento econômico da região".

Dr Otávio, representante da BBF, lembra que houve três mortes de pessoas que se aventuraram a roubar nas fazendas sem equipamentos de segurança e que, se as ordens forem cumpridas, volta a reinar a paz.

Foi denunciado que há um esquema de receptação dos frutos que têm um mercado muito ativo, mas, durante as discussões, ficou clara a existência de um conflito de instituições, o que termina por deixar um sentimento de impunidade em relação às ações do crime.

Por sua vez, o representante dos indígenas, advogado Jorde Tembé, passou a palavra ao representente do Ministério Público Federal no Pará, procurador Felipe Palha. O juiz Mairton Carneiro perguntou ao advogado se era isso mesmo que ele desejava, que o MPF se manifestasse em seu lugar, recebendo resposta positiva. Assim, Felipe Palha questionou a falha no processo de licenciamento do empreendimento sem consulta aos povos indígenas e quilombolas, como prevê a convenção 169 da OIT. As terras indígenas da região de Tomé-Açu, segundo informações durante o encontro, formam a menor área indígena do Brasil.

Defendeu ainda o representante dos indígenas que o caso fique na esfera federal e que o próximo encontro se realize em local aberto e que todos tenham direito de falar. No entanto, o desembargador Mairton Carneiro reforçou que já está definido pelo próprio STF - Supremo Tribunal Federal - que esse tipo de impasse deve ser resolvido a nível de judiciário estadual.

PERIGO

Andrea Barreto, defensora pública do Estado, representa os quilombolas. Ela destacou processos de regularização fundiária no Incra e Iterpa, que transcorrem de forma morosa e que o conflito vem desde a época da Vale.

Já o Incra - Instituto Nacional
de Colonização e Reforma Agrária reconheceu a ausência  do Estado Brasileiro em resolver com celeridade essas questões, o que faz todo mundo se sentir dono de tudo, o que foi bastante criticado pelo desembargador presidente dos trabalhos.

De seu lado, o Ministério Público Federal explicou que o cumprimento de decisões de reintegração - veementemente reiterado pela BBF -, pode agravar mais o clima de tensão e lembrou que o Pará tem experiências catastróficas desses cumprimentos, terminando nas manchetes internacionais. (Transcrito de A Província do Pará)

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