"Sobral Santos II e Novo Amapá - 40 anos das tragédias fluviais que abalaram o Brasil"

Acabei de ler a obra do conceituado jornalista Evandro Corrêa, cabra bom, sangue bom, raçudo, corajoso, proprietário do site O Antagônico, intitulada Sobral Santos II e Novo Amapá - 40 anos das tragédias fluviais que abalaram o Brasil", publicada pela Marques Editora, com singelas homenagens ao jornalista Sebastião Farconara, irmão do autor, falecido ano passado; Joseane Souza, esposa; aos filhos, Alanno, Annanda e Alanna, além da neta Marinna.

São 356 páginas de jornalismo, nas quais Evandro Corrêa mostra, com riqueza de detalhes, numa literatura simples e elegante, as tragédias ocorridas nos rios da Amazônia, envolvendo especialmente os estados do Pará, Amapá e Amazonas. O destaque são os naufrágios dos navios Novo Amapá e Sobral Santos II. O primeiro, na verdade, era um barco mercante de madeira, que afundou com mais de 300 almas tragadas pelas águas do Rio Cajari, no Amapá, em 6 de janeiro de 1981, naquela que foi uma das maiores tragédias fluviais de que se tem notícia na Amazônia. O segundo, verdadeiramente um navio, de ferro, o Sobral Santos II, que foi a pique perto do porto da cidade de Óbidos, no Pará, no mesmo ano de 1981, mais precisamente, a 19 de setembro, quando morreram - em números aproximados, cerca de 300 pessoas (o número de mortos pode ser bem superior, pois há muitas histórias em torno da situação que envolveu o acidente).

Evandro Corrêa passa pelos naufrágios do barco Correio do Arari, em frente à ilha das Onças, em Belém, onde morreram 57 pessoas; navios Anna Karolinne III, Capitão Ribeiro, boiadeiro Haidar, em Barcarena, entre dezenas de outros; os maiores naufrágios ocorridos na história da humanidade, passando pelo Titanic; as questões naturais, a ganância, a arrogância de muitos, a teimosia das pessoas, a falta de conhecimento, o desafio às leis, a negligência dos órgãos de fiscalização e as irresponsabilidades.

O que mais chama atenção na obra de Evandro Corrêa, além das tragédias em si, é a cadeia de situações que colaboram para esses trágicos eventos, a começar pelas dificuldades de transportes seguros nos rios da Amazônia, onde a água são as avenidas por onde passam centenas de milhares de embarcações, a maioria, sem registro e onde é impossível as autoridades marítimas cobrirem toda a malha fluvial. Para completar, tem a ganância dos donos e empresas proprietárias de embarcações que transportam passageiros e cargas sem qualquer metodologia de segurança. Tufic Mourão, um dos proprietários do Sobral Santos II, só se preocupou em segurar o cofre com suas riquezas. De seu navio, centenas de pessoas foram tragadas pelas águas do Rio Amazonas e muitos corpos sequer foram encontrados. Há casos não comprovados de tentativas, do dono da embarcação e seu sócio, de esconderem o número real de pessoas a bordo do navio que, por incrível que pareça, continua navegando na Amazônia, com o novo nome de "Cisne Branco". Estima-se que havia mais de 500 passageiros a bordo no momento em que, de madrugada, a embarcação emborcou em local de grande profundidade na garganta do Rio Amazonas.

Há, ainda, a questão da superlotação por causa das pessoas imprudentes que se aventuram nessas viagem mesmo sabendo que podem não chegar a seus destinos, somado à ganância dos donos de embarcações, que estão interessados apenas nos lucros e nunca na vida humana transportada com carga incluindo carros a bordo; fiscalização sob "vista grossa" de quem deveria fazer um trabalho sério e que ganha muito bem para isso. Evandro fala sobre a condenação da União em vários processos e da própria Marinha, dos donos de embarcações, além das pessoas que nunca receberam nada pelos prejuízos e por perdas de entes queridos.

É uma obra prima de reportagem que vale a pena ser lida para se entender melhor sobre a Amazônia, seus encantos, sua cultura e o que há sob as águas dos rios que mais se parecem com o mar.
 

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Povo esquecido e abandonado no Tapanã

MP recebe dossiê contra o presidente da Câmara de Vereadores de Tomé-Açu

Comportamento de vereador, candidato a prefeito, chama atenção da população do Tauá